sexta-feira, 15 de abril de 2016

"Cunha recebeu propina de R$ 52 milhões em 36 parcelas", afirma delator da Lava Jato

Presidente da Câmara teria recebido dinheiro referente às obras do Porto Maravilha, no Rio

Cunha recebeu propina de R$ 52 milhões em 36 parcelas, afirma delator | Foto: Wilson Dias / ABr / CP
   Cunha recebeu propina de R$ 52 milhões em 36 parcelas, afirma delator | Foto: Wilson Dias / ABr / CP

Em delação premiada à Procuradoria-Geral da República, na operação Lava Jato, o empresário Ricardo Pernambuco Júnior, da Carioca Engenharia, entregou aos investigadores uma tabela que aponta 22 depósitos somando 4,6 milhões de dólares em propinas supostamente pagas ao presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) entre 10 de agosto de 2011 e 19 de setembro de 2014.

Segundo o empreiteiro, empresas relacionadas às obras do Porto Maravilha, no Rio, deveriam pagar R$ 52 milhões ou 1,5% do valor total dos Certificados de Potencial de Área Construtiva (Cepac) a Eduardo Cunha. A parte que caberia à Carioca era de R$ 13 milhões.

O maior repasse ocorreu em 26 de agosto de 2013 no valor de 391 mil dólares depositados em conta do peemedebista no banco suíço Julius Baer. Em 2011 foram quatro depósitos, somando 1,12 milhão de dólar. Em 2012, Eduardo Cunha recebeu só dessa fonte outros 1,34 milhão de dólares divididos em seis depósitos. A tabela revela que em 2013 o deputado - que ainda não exercia a presidência da Casa -, foi contemplado com mais seis depósitos, totalizando 1,4 milhão de dólar. Já em 2014, Eduardo Cunha recebeu outros seis depósitos que somaram 804 mil dólares.

A tabela com o caminho das propinas é dividida em duas partes. "Em relação a primeira tabela, que totaliza 3,9 milhões de dólares tem certeza de que foram destinadas a contas apontadas pela deputado Eduardo Cunha; que em relação a segunda tabela, no valor total de 696 mil dólares, é altíssima a probabilidade de que também eram valores destinados a contas indicadas por Eduardo Cunha, por todo o trabalho investigativo que fizeram, em especial porque não fizeram pagamentos deste tipo a outras pessoas e, também, pelo valor das transferências", afirmou o empresário.

"Em nenhum momento Eduardo Cunha lhe disse que as contas eram de titularidade dele, mas tem certeza de que todas estas contas foram indicadas pelo deputado Eduardo Cunha; que tampouco o depoente chegou a perguntar a Eduardo Cunha sobre o titular das referidas contas." Em 14 páginas, o empresário Raul Pernambuco Júnior narra com detalhes encontro com o presidente da Câmara para combinar como seriam realizados pagamentos no exterior. Raul Pernambuco Júnior descreveu uma reunião no Hotel Sofitel, em Copacabana, no Rio, que, segundo ele, teria ocorrido entre junho e julho de 2011, época da aquisição das Cepac's pelo Fundo de Investimento do FGTS.

"O depoente não estava presente, mas seu pai e um executivo da Carioca de nome Marcelo Macedo estiveram presentes a esta reunião; que após esta reunião, o depoente foi chamado pelo seu pai; que seu pai lhe comunicou que Léo Pinheiro, da OAS, e Benedicto Junior, da Odebrecht, na reunião do Hotel Sofitel, comunicaram que havia uma solicitação e um 'compromisso' com o deputado Eduardo Cunha, em razão da aquisição, pela FI-FGTS, da totalidade das CEPAC's", declarou.

O empreiteiro detalhou "que o valor destinado a Eduardo Cunha seria de 1,5% do valor total das Cepac's, o que daria em tomo de R$ 52 milhões devidos pelo consórcio, sendo R$ 13 milhões a cota parte da Carioca; que este valor deveria ser pago a Eduardo Cunha em 36 parcelas mensais; que seu pai disse ao depoente que cada uma das empresas "assumiria" a sua parte diretamente com Eduardo Cunha." À Procuradoria, o delator contou que o primeiro pagamento no Israel Discount Bank para Eduardo Cunha ocorreu em 10 de agosto de 2011, no valor de 220.777.000 dólares. Raul Pernambuco Júnior relatou que houve uma dificuldade do Banco de seu pai para efetuar a transferência, em razão do banco destinatário.

O delator contou aos procuradores da Lava Jato que entrou em contato com Eduardo Cunha e marcaram uma primeira reunião. Raul Pernambuco Júnior disse não se recordar se o encontro se deu no escritório político do deputado, no centro do Rio, ou na Câmara, em Brasilia, "mas acredita que tenha sido no escritório político". O empresário afirmou acreditar que a reunião tenha ocorrido no início de agosto de 2011.

De acordo com Raul Pernambuco Júnior, durante a reunião, ele perguntou sobre o "compromisso" estabelecido e, inclusive, o valor, o que foi confirmado por Eduardo Cunha. O empresário disse que ele e o pai não queriam que o dinheiro passasse "por dentro da empresa", para ser o mais reservado possível. O delator contou que questionou Eduardo Cunha "sobre a possibilidade de estes pagamentos serem feitos em contas no exterior". "Eduardo Cunha disse que não haveria problema nenhum e, neste momento, ele indicou a primeira conta em que deveria ser efetivado o pagamento", relatou Raul Pernambuco Júnior.

"Eduardo Cunha passou a conta em um papel, com os dados já digitados; que se lembra bem deste primeiro pagamento, porque o Banco indicado por Eduardo Cunha era denominado Israel Discount Bank; que não sabia se este banco era realmente em Israel; que já ficou estabelecido, inclusive, o valor do primeiro pagamento; que, dividindo o valor total devido pelo número de parcelas, o valor de cada parcela era de cerca de R$ 360 mil." O empreiteiro disse que a reunião deve ter durado cerca de 30 minutos, "oportunidade em que se conheceram melhor". Raul Pernambuco Júnior afirmou que "até então não se conheciam ou ao menos não se recorda de tê-lo conhecido pessoalmente".

"O depoente disse nessa reunião a Eduardo Cunha que seria impossível fazer depósitos mensais; que o depoente disse a Eduardo Cunha que fariam depósitos com periodicidade irregular; que esta impossibilidade de realizar depósitos mensais decorria da precaução que seu pai tinha em dar as ordens bancárias para o exterior; que o pai do depoente normalmente dava tais ordens aos gerentes das contas no exterior pessoalmente, seja em viagens que seu genitor fazia ao exterior ou, ainda, quando o gerente vinha ao Brasil; que não sabe se seu pai enviava ordens por outro meio de comunicação à distância, como fax ou e-mail."

"A pedido de seu genitor, o depoente solicitou uma reunião com Eduardo Cunha, por meio da secretária do depoente; que a secretária do depoente, de nome Sheila Oliveira, entrou em contato com a secretária do deputado Eduardo Cunha e, em seguida, enviou um e-mail para o depoente, questionando qual seria a 'pauta para a reunião'"; que o depoente respondeu o e-mail afirmando que "Ele está a par. Só avisa q sou eu", declarou. Segundo o delator, este e-mail é datado de 16 de agosto de 2011. Raul Pernambuco Júnior disse que a reunião 'foi efetivamente marcada e realizada, não se recordando ao certo onde'.

"Nesta reunião, ocorrida provavelmente entre final de agosto e início de setembro, perguntou a Eduardo Cunha se haveria a possibilidade de mudar o banco e indicar uma conta na própria Suíça; que Eduardo Cunha concordou e disse não haver problemas; que Eduardo Cunha, no mesmo ato, já indicou a conta Esteban Garcia, no banco Merryl Lynch Bank, na Suíça; que a partir daí todos os depósitos para Eduardo Cunha foram na Suíça", declarou. "Se estabeleceu que se houvesse necessidade de alteração do banco, isto deveria partir do deputado Eduardo Cunha; que, de qualquer forma, em toda oportunidade em que iriam fazer os pagamentos, o depoente ligava ou se encontrava com Eduardo Cunha para perguntar se "mantínhamos o mesmo endereço".

"O delator narrou ainda que por uma ou duas vezes, as contas no exterior eram enviadas por Eduardo Cunha para ele, em envelopes lacrados e sigilosos, para a filial da Carioca em São Paulo, 'contendo os dados da conta e códigos de transferência'". A defesa de Eduardo Cunha foi procurada pela reportagem nessa quinta-feira, mas ainda não se manifestou.


ESTADÃO conteúdo
Correio do Povo

15/04/2016 | 10:29 | Atualização: 10:37

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