Presidente da
Câmara teria recebido dinheiro referente às obras do Porto Maravilha, no Rio
Cunha recebeu propina de R$ 52 milhões em 36 parcelas, afirma delator | Foto: Wilson Dias / ABr / CP
Em delação
premiada à Procuradoria-Geral da República, na operação Lava
Jato, o empresário Ricardo Pernambuco Júnior, da Carioca
Engenharia, entregou aos investigadores uma tabela que aponta 22 depósitos
somando 4,6 milhões de dólares em propinas supostamente pagas ao presidente da
Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) entre 10 de agosto de 2011 e 19
de setembro de 2014.
Segundo o
empreiteiro, empresas relacionadas às obras do Porto Maravilha, no Rio,
deveriam pagar R$ 52 milhões ou 1,5% do valor total dos Certificados de
Potencial de Área Construtiva (Cepac) a Eduardo Cunha. A parte que caberia
à Carioca era de R$ 13 milhões.
O maior
repasse ocorreu em 26 de agosto de 2013 no valor de 391 mil dólares depositados
em conta do peemedebista no banco suíço Julius Baer. Em 2011 foram quatro
depósitos, somando 1,12 milhão de dólar. Em 2012, Eduardo Cunha recebeu só
dessa fonte outros 1,34 milhão de dólares divididos em seis depósitos. A tabela
revela que em 2013 o deputado - que ainda não exercia a presidência da
Casa -, foi contemplado com mais seis depósitos, totalizando 1,4 milhão de
dólar. Já em 2014, Eduardo Cunha recebeu outros seis depósitos que somaram 804
mil dólares.
A tabela
com o caminho das propinas é dividida em duas partes. "Em relação a
primeira tabela, que totaliza 3,9 milhões de dólares tem certeza de que foram
destinadas a contas apontadas pela deputado Eduardo Cunha; que em relação a
segunda tabela, no valor total de 696 mil dólares, é altíssima a
probabilidade de que também eram valores destinados a contas indicadas por
Eduardo Cunha, por todo o trabalho investigativo que fizeram, em
especial porque não fizeram pagamentos deste tipo a outras pessoas e,
também, pelo valor das transferências", afirmou o empresário.
"Em
nenhum momento Eduardo Cunha lhe disse que as contas eram de titularidade dele,
mas tem certeza de que todas estas contas foram indicadas pelo deputado Eduardo
Cunha; que tampouco o depoente chegou a perguntar a Eduardo Cunha sobre o
titular das referidas contas." Em 14 páginas, o empresário Raul Pernambuco
Júnior narra com detalhes encontro com o presidente da Câmara para
combinar como seriam realizados pagamentos no exterior. Raul Pernambuco Júnior
descreveu uma reunião no Hotel Sofitel, em Copacabana, no Rio, que,
segundo ele, teria ocorrido entre junho e julho de 2011, época da
aquisição das Cepac's pelo Fundo de Investimento do FGTS.
"O
depoente não estava presente, mas seu pai e um executivo da Carioca de nome
Marcelo Macedo estiveram presentes a esta reunião; que após esta reunião, o
depoente foi chamado pelo seu pai; que seu pai lhe comunicou que Léo
Pinheiro, da OAS, e Benedicto Junior, da Odebrecht, na reunião do Hotel
Sofitel, comunicaram que havia uma solicitação e um 'compromisso' com o
deputado Eduardo Cunha, em razão da aquisição, pela FI-FGTS, da totalidade das
CEPAC's", declarou.
O
empreiteiro detalhou "que o valor destinado a Eduardo Cunha seria de 1,5%
do valor total das Cepac's, o que daria em tomo de R$ 52 milhões devidos pelo
consórcio, sendo R$ 13 milhões a cota parte da Carioca; que este valor
deveria ser pago a Eduardo Cunha em 36 parcelas mensais; que seu pai disse ao
depoente que cada uma das empresas "assumiria" a sua
parte diretamente com Eduardo Cunha." À Procuradoria, o delator
contou que o primeiro pagamento no Israel Discount Bank para Eduardo Cunha
ocorreu em 10 de agosto de 2011, no valor de 220.777.000 dólares. Raul
Pernambuco Júnior relatou que houve uma dificuldade do Banco de seu pai para
efetuar a transferência, em razão do banco destinatário.
O delator
contou aos procuradores da Lava Jato que entrou em contato com Eduardo Cunha e
marcaram uma primeira reunião. Raul Pernambuco Júnior disse não se recordar se
o encontro se deu no escritório político do deputado, no centro do Rio, ou
na Câmara, em Brasilia, "mas acredita que tenha sido no escritório
político". O empresário afirmou acreditar que a reunião
tenha ocorrido no início de agosto de 2011.
De acordo
com Raul Pernambuco Júnior, durante a reunião, ele perguntou sobre o
"compromisso" estabelecido e, inclusive, o valor, o que foi
confirmado por Eduardo Cunha. O empresário disse que ele e o pai
não queriam que o dinheiro passasse "por dentro da empresa",
para ser o mais reservado possível. O delator contou que questionou Eduardo
Cunha "sobre a possibilidade de estes pagamentos serem feitos em
contas no exterior". "Eduardo Cunha disse que não haveria
problema nenhum e, neste momento, ele indicou a primeira conta em que deveria
ser efetivado o pagamento", relatou Raul Pernambuco Júnior.
"Eduardo
Cunha passou a conta em um papel, com os dados já digitados; que se lembra bem
deste primeiro pagamento, porque o Banco indicado por Eduardo Cunha era
denominado Israel Discount Bank; que não sabia se este banco era realmente
em Israel; que já ficou estabelecido, inclusive, o valor do primeiro pagamento;
que, dividindo o valor total devido pelo número de parcelas, o valor de
cada parcela era de cerca de R$ 360 mil." O empreiteiro disse que a
reunião deve ter durado cerca de 30 minutos, "oportunidade em que se
conheceram melhor". Raul Pernambuco Júnior afirmou que "até então
não se conheciam ou ao menos não se recorda de tê-lo conhecido
pessoalmente".
"O
depoente disse nessa reunião a Eduardo Cunha que seria impossível fazer
depósitos mensais; que o depoente disse a Eduardo Cunha que fariam depósitos
com periodicidade irregular; que esta impossibilidade de realizar
depósitos mensais decorria da precaução que seu pai tinha em dar as ordens
bancárias para o exterior; que o pai do depoente normalmente dava
tais ordens aos gerentes das contas no exterior pessoalmente, seja em
viagens que seu genitor fazia ao exterior ou, ainda, quando o gerente vinha ao
Brasil; que não sabe se seu pai enviava ordens por outro meio de
comunicação à distância, como fax ou e-mail."
"A
pedido de seu genitor, o depoente solicitou uma reunião com Eduardo Cunha, por
meio da secretária do depoente; que a secretária do depoente, de nome
Sheila Oliveira, entrou em contato com a secretária do deputado Eduardo Cunha
e, em seguida, enviou um e-mail para o depoente, questionando qual seria a
'pauta para a reunião'"; que o depoente respondeu o e-mail afirmando que
"Ele está a par. Só avisa q sou eu", declarou. Segundo o delator,
este e-mail é datado de 16 de agosto de 2011. Raul Pernambuco Júnior
disse que a reunião 'foi efetivamente marcada e realizada, não se recordando ao
certo onde'.
"Nesta
reunião, ocorrida provavelmente entre final de agosto e início de setembro,
perguntou a Eduardo Cunha se haveria a possibilidade de mudar o banco e indicar
uma conta na própria Suíça; que Eduardo Cunha concordou e disse não haver
problemas; que Eduardo Cunha, no mesmo ato, já indicou a conta Esteban Garcia,
no banco Merryl Lynch Bank, na Suíça; que a partir daí todos os depósitos
para Eduardo Cunha foram na Suíça", declarou. "Se estabeleceu que se
houvesse necessidade de alteração do banco, isto deveria partir do deputado
Eduardo Cunha; que, de qualquer forma, em toda oportunidade em que iriam
fazer os pagamentos, o depoente ligava ou se encontrava com Eduardo Cunha para
perguntar se "mantínhamos o mesmo endereço".
"O
delator narrou ainda que por uma ou duas vezes, as contas no exterior eram
enviadas por Eduardo Cunha para ele, em envelopes lacrados e sigilosos, para a
filial da Carioca em São Paulo, 'contendo os dados da conta e códigos de
transferência'". A defesa de Eduardo Cunha foi procurada pela reportagem
nessa quinta-feira, mas ainda não se manifestou.
ESTADÃO conteúdo
Correio
do Povo
15/04/2016 | 10:29 | Atualização: 10:37
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