Leandro Boldrini, Graziele Ugulini, Evandro e Edelvânia
Wirganovicz, acusados de serem responsáveis pelo homicídio do menino Bernardo
Boldrini, serão julgados na Comarca de Três Passos. A decisão, por maioria, é
da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, que negou o pedido feito, de
ofício, pela Juíza de Direito Sucilene Engler Werle, titular da Vara Judicial
daquela Comarca.
No pedido, a magistrada considerou que a transferência do local do
julgamento (chamado de desaforamento) para a Comarca de Porto Alegre seria
medida necessária para garantir o interesse da ordem pública, a imparcialidade
do júri e a segurança pessoal dos acusados.
Decisão
"Por certo, os fatos imputados aos réus foram os de maior
repercussão na história da Comarca de Três Passos. Resta, portanto, evidente
que as pessoas da comunidade, juízes naturais dos crimes dolosos contra a vida,
tenham, de alguma forma, ouvido conversas ou declinado manifestações sobre os
fatos, como também o fizeram os magistrados, os membros do Ministério Público,
os advogados e os profissionais do direito e os de diversas áreas do
conhecimento", considerou o relator do recurso, Desembargador Sylvio
Baptista Neto, que também presidente a 1ª Câmara Criminal do TJRS.
O magistrado citou decisões das Cortes Superiores a respeito do
desaforamento, que se trata de medida excepcional. Afirmou que, apesar de ser
inegável a repercussão nacional e internacional do caso, com grande carga de
informações, isso não causaria efeito a transferência de local do julgamento. "Existem
fatos que, quando da cobertura de imprensa, passam a ter repercussão geral, com
caráter difuso. O chamado 'Caso Bernardo', como o da 'Boate Kiss', o 'Caso
Nardoni', o 'Caso Bruno' (...). Por certo que as mesmas informações que possuem
a pessoas que vivem na Cidade de Três Passos, também, possuem as que residem na
região, as de nosso Estado e de nosso País (...). Assim, o deslocamento do
julgamento, ferindo o princípio do juiz natural, praticamente teria o mesmo
efeito, pois se o julgamento fosse marcado para uma Comarca próxima ou na
Capital, também haveria movimento midiático, envolvimento social, manifestações
e outros episódios como os destacados na representação", considerou o
relator, citando o parecer do MP.
Quanto à estrutura do Salão do Júri da Comarca, considerado
pequeno para comportar um Júri de grande repercussão, o Desembargador Sylvio
considerou que cabe ao Juiz Presidente manter a sobriedade do julgamento.
"O que vai ocorrer na Sessão do Júri é um julgamento, apenas, e não um
espetáculo midiático. Todos nós sabemos que o Tribunal do Júri comporta, pela
dialética e pela forma, a transformação da Sessão em espetáculo, muitas vezes,
onde, pela atenção midiática, as partes procuram sobrepor os seus talentos
personalíssimos. Todavia, essa é uma das funções do Juiz Presidente, que deve
impedir que a sobriedade e que a seriedade do julgamento pelo Tribunal do Júri
se transforme em espetáculo."
Também, em relação à segurança dos réus asseverou que cabe ao
Estado zelar pela segurança de todos, como ocorreu ao longo da instrução do
processo: "Os réus estão hoje sob proteção do Estado, nos últimos quatro
anos eles participaram de toda a instrução do processo sob proteção do Estado
e, também, participaram de audiências e atos judiciais sob a proteção do Estado."
Ainda, o argumento de que serão 28 as testemunhas ouvidas no
Plenário, fato que poderia impor a reserva de espaço separado, em razão da
incomunicabilidade, também não entendeu ser motivo de deslocamento da
competência do Tribunal do Júri. "Por certo, seria muito mais difícil
manter a incomunicabilidade e seria muito mais oneroso ao Poder Judiciário,
deslocar as 28 testemunhas para as Comarcas da região ou para a Capital do
Estado, mantendo-as isoladas e incomunicáveis. Quanto ao argumento referente à imparcialidade
dos jurados, não há fato concreto algum, apenas presunção genérica de
imparcialidade."
O Desembargador Manuel José Martinez Lucas acompanhou o voto do
relator.
Divergência
O Desembargador Honório Gonçalves da Silva Neto divergiu dos
colegas, votando em favor do pleito da Juíza. "Não há como identificar se
algum dos possíveis jurados, que serão sorteados na sessão plenária, não
participou das manifestações anteriormente realizadas na cidade; não tenha se
manifestado nas redes sociais sobre o fato ou que tenha algum vínculo com as
pessoas ouvidas na fase inquisitorial e processual, o que causa a dúvida sobre
a imparcialidade do júri, principal motivo para o pedido de desaforamento, pois
fere diretamente o princípio constitucional do juízo natural. Não há, pois,
possibilidade de haver um julgamento justo com o corpo de jurados parcial."
Desaforamento nº 70078181633
Fonte: Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul
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