A maior parte dos profissionais deveria atuar nas
equipes de Estratégia de Saúde da Família (ESF) e em postos das periferias
Foto: Marcelo Oliveira / Agencia RBS
Uma das
missões do Diário Gaúcho é situar o leitor sobre os acontecimentos sociais. A
onda de protestos que sacode o Brasil abriga manifestos contra o aumento da
passagem, contra a Copa e pedidos de melhorias nas áreas de transporte, saúde,
educação, combate à corrupção. Temas que atingem o leitor em sua vida real. Os
repórteres do DG, ao longo de 13 anos, assistiram a esse cotidiano e atuaram
como porta-vozes, denunciando falhas e corrupções. Para ressaltar a importância
desses pedidos, relembramos reportagens que fizemos junto com você, leitor. Sem
vandalismo, mostramos assuntos que devem ser solucionados se queremos que o
Brasil mude para melhor.
Por falta
de candidatos, 241 vagas para médicos (de clínicos a especialistas) não estão
preenchidas em Porto Alegre e outras dez cidades da Região Metropolitana. O
levantamento foi feito pelo Diário Gaúcho. A maior parte dos profissionais
deveria atuar nas equipes de Estratégia de Saúde da Família (ESF) e em postos
das periferias.
É no
cotidiano das comunidades que as necessidades aparecem. Seja na rede básica, na
busca por ficha, na retirada de medicamentos gratuitos, na procura por
emergências ou na espera por cirurgia.
Quem utiliza
o Sus, como a vendedora de doces e salgados Cláudia Machado, vê diariamente os
pontos críticos - ressaltados em cartazes em protestos que se espalham pelo
Brasil. O cidadão sabe que, se falta médico no posto, aparece a superlotação da
emergência. Se o agendamento é ineficiente, a fila pode levar dolorosos anos.
Entre
chiadeira e promessas
O
presidente do Sindicato Médico do Estado (Simers), Paulo Argollo, alega três
fatores: salário considerado baixo, condições precárias de trabalho e falta de
plano de carreira (no qual o Estado faria as contratações).
- O piso
nacional é de R$ 20 mil (para 40 horas semanais), mas as prefeituras querem
pagar a metade - diz Paulo.
Esta
polêmica é a base do impasse que levou a presidente Dilma Rousseff a incentivar
o envio de médicos estrangeiros para onde falta profissional. Além disso, há
dois dias, prometeu abater dívidas com hospitais filantrópicos em troca de mais
vagas para o Sus.
Levantamento
do Diário Gaúcho escancara uma triste realidade na saúde pública em 11 cidades
da Região Metropolitana, incluindo Porto Alegre.
Esteio: na
periferia
Há quase
dois meses, a prefeitura de Esteio tem três vagas para médicos nas ESFs. O
salário é de R$ 11 mil (40h). Existem, ainda, seis para pediatras.
Segundo o
secretário da Saúde, Jerônimo Paludo, os postos com dificuldades estão na
periferia da cidade. Em breve, terá contratação emergencial e provisória via
Fundação São Camilo de 12 médicos (20h) e seis (40h).
No segundo
semestre, está previsto um concurso para outras 15 vagas.
- Queremos
chegar ao final deste ano com 45% de cobertura da Estratégia. Mas dependemos de
encontrar médicos - constata Jerônimo.
Sapucaia:
no desespero
Secretário
da Saúde de Sapucaia do Sul, José Wink não consegue preencher dez vagas de
imediato e já teme pelas outras 15 que serão abertas até o fim do ano. Após
concurso de 2011, com salário de R$ 9,2 mil (40h), só conseguiu preencher oito
das 16 vagas para médicos de ESF.
- Eles não
querem vínculo de 40 horas, preferem plantões. Já flexibilizamos para 30 horas,
mas não conseguimos atraí-los.
José
afirma que o local onde o médico trabalhará acaba influenciando na decisão. Um
próximo concurso deve ser aberto em 2014.
- Do jeito
que estamos, contrato de forma emergencial por seis meses até quem tenha quatro
horas disponíveis - afirma, desesperado.
Eldorado:
complexidade
Secretária
de Saúde de Eldorado do Sul, Liege Ferrari diz que a falta de 18 médicos
estaria relacionada à classificação do município, dada pelo Sus como de baixa
complexidade - com atendimento básico e sem hospital.
- Os
médicos que atendem nas UBS têm dificuldade de fazer diagnósticos, pois a
marcação de exames e consultas com especialistas pelo Sus é morosa.
Segundo
ela, isso dificulta a investigação e retarda o diagnóstico e o tratamento. Os
plantonistas ficam sem condições técnicas para atender na urgência ou
transferir paciente quando é caso urgente.
Outras
queixas na Capital
- Na ESF
Domênico Feoli, no Bairro Rubem Berta, a comunidade reclama a falta de médico.
Há apenas enfermeiros e técnicos. A prefeitura diz que o posto não foi
inaugurado oficialmente pela ausência de médico. Enquanto isso, o posto funciona
parcialmente. Atendimentos têm sido na UBS Rubem Berta. Não há médicos na rede
para ocupar a vaga. Será necessário concurso.
- Na UBS
Santa Rosa, usuários reclamam a falta de médico. A SMS confirma o déficit e
informa que a unidade conta com um clínico, dois pediatras e um ginecologista.
Como a comunidade é grande, deveria contar com mais um clínico. Não há médicos
na rede para ocupar a vaga. Será necessário concurso.
- Falta
médico no Beco do Adelar, ESF Vila Nova Ipanema. A carência foi confirmada pela
SMS. Conforme a secretaria, um concurso emergencial deverá ser feito para o
preenchimento dessa vaga.
Drama na
Pitinga
Em três
folhas de rascunho, a técnica de enfermagem Cláudia Maurília Silva Machado, 46
anos, organizou a lista de problemas na Vila Pitinga - depois de digitá-la numa
lan house, ela pretende entregar nas mãos do governador para que ele resolva ou
divida a missão com o prefeito de Porto Alegre. O primeiro deles é a falta de
médico na ESF Vila Pitinga.
- Moro há
um ano e cinco meses aqui e ainda não tive o prazer de conhecer a médica. Fui
sete vezes, pelo meio do mato para cortar caminho, e desisti. Precisava fazer
exames, levar minhas filhas, mas não tinha nada. E nem adianta ir em outro
posto: não atendem - lamenta Cláudia.
Enquanto o
país tem saído às ruas para expressar indignação e pedir por saúde e educação e
rechaçar a corrupção, mais uma vez Cláudia vive no dia a dia a carência de
médicos na rede pública.
- É muito
fácil pedir saúde quando a pessoa não sente na pele, não vive no dia a dia a
dificuldade para conseguir uma consulta.
Ela teve
de gastar R$ 105
Cansada da
espera, Cláudia tirou do sustento das filhas o pagamento de consulta numa
clínica. Pela mamografia, desembolsou R$ 50. E pela ecografia transvaginal, R$
55.
- Só
conseguimos atendimento de emergência (no Pronto Atendimento Lomba do Pinheiro)
na Parada 12 e, da última vez, entrei com a minha filha às 18h e só saímos às
6h do dia seguinte - diz a técnica de enfermagem, que abandonou a profissão e
hoje faz e vende doces e salgados.
Gastos
para a Copa irritam
Na lista
que Cláudia pretende entregar ao governador Tarso Genro há, ainda, queixas
relacionadas a saneamento básico e pavimentação.
-
Resolveram que o dinheiro (público) irá para as exuberâncias da Copa do Mundo
de 2014, e nós que pagamos impostos ficamos com esgoto a céu aberto, sem calçamento,
sem médico no posto.
A licença
maternidade
A
Secretaria Municipal da Saúde (SMS) contesta a informação de que a ESF Vila
Pitinga está sem médico há mais de um ano. Conforme a SMS, o posto está sem a
médica há seis meses por conta da licença maternidade da profissional, mas a
gerente distrital fez alguns encaminhamentos.
O retorno
da médica está previsto para 9 de julho. Na sua ausência, a orientação aos
usuários é procurarem a ESF Vila Pitinga e, conforme a necessidade,
profissionais do posto fazem contato com a USF Castelo, a USF 5ª Unidade ou a
USF Núcleo Esperança para solicitar atendimento.
Onde
faltam os profissionais
Observação:
a assessoria de Canoas não enviou os dados solicitados pelo Diário Gaúcho.
PORTO
ALEGRE
- Quantos
- 42 médicos de ESF
- Onde -
Em todas as regiões, principalmente, nos bairros Restinga, Rubem Berta e Mário
Quintana.
- Salário
- R$ 9.584,45 (40h). O Imesf reconhece que o salário não é atrativo e estuda
plano de carreira.
-
Contratação - A prefeitura chamou 15 médicos do concurso mais recente, mas só
oito assumiram. Um novo concurso está sendo preparado para 45 vagas
temporárias.
ALVORADA
- Quantos
- 4 médicos
- Onde -
UBS Stella Maris (clínico geral), UBS Tijuca (clínico geral), URS 02 (pediatra)
e URS 03 (pediatra)
- Salário
- Para clínico em posto de saúde é de R$ 5.087,37 (20h) e R$ 10.076,34 (40h).
Para médicos gerais comunitários (via CLT) é de R$ 9,3 mil (40h). A bolsa da
União aos médicos integrantes do Programa de Valorização da Atenção Básica
(Provab) é de R$ 8 mil (40h).
-
Contratação - É feita via concurso, bolsa do Provab e terceirizados. Para este
ano, está previsto concurso para diversas áreas e médicos gerais comunitários.
SÃO
LEOPOLDO
- Quantos -
50 médicos (30 clínicos para plantões e 20 especialistas)
- Onde -
Situação generalizada: ESF, UBSs e centros especialidades.
- Salário
- Para ambulatório (20h), R$ 2.786. Para um plantonista, valor quase duplica. O
secretário da Saúde, Ivo Leuck, reconhece que os salários não são competitivos.
-
Contratação - Via concurso ou contrato emergencial de seis meses. Nos últimos
seis meses, a prefeitura conseguiu aprovação para a contração de 32: mais da
metade das vagas não foi preenchida.
VIAMÃO
- Quantos
- 15 médicos (seis para ESF e o restante para cardiologia, ginecologia,
pediatria e clínico)
- Onde -
Postos de ESF. Das nove equipes, seis estão sem médicos.
- Salário
- R$ 11 mil para médicos de ESF (40h). A especialistas, paga-se, por 15 horas
semanais, R$ 3,8 mil.
-
Contratação - Segundo a secretária de Saúde, Sandra Speretto, foi realizado um
concurso na gestão passada, mas nenhum médico assumiu e não há lista de espera.
Um novo concurso está em estudo.
CACHOEIRINHA
- Quantos
- 40 médicos (quatro de família, seis pediatras, dois cardiologistas e dois
ortopedistas concursados e outras 26 vagas para contratação emergencial nas
áreas de pediatria, ortopedia e cardiologia)
- Onde -
Centro de Especialidades de Cachoeirinha, Pronto Atendimento 24 Horas, e na
Rede Básica na UBS Getúlio Vargas, e na ESF Canarinho, Carlos Wilkens, Araçá, e
Otacílio para substituir médica em licença maternidade.
- Salário
- Médico 8h/semanais: salário base R$ 2.292,23 (mais plano de carreira dos
servidores municipais de Cachoeirinha). Médico ESF 20h/semanais: salário base
de R$ 2.292,23 mais gratificação de R$ 3.405,80. Total de R$ 5.698,03 (mais
plano de carreira dos servidores municipais). Médico ESF 40h/semanais: salário
base R$ 2.292,23 mais gratificação de R$ 9.103,81, totalizando R$ 11.396,04
(mais plano de carreira dos servidores de Cachoeirinha).
-
Contratações - Existe um edital aberto para contrato emergencial e a perspectiva
de concurso público para o final deste ano.
GRAVATAÍ
- Quantos
- 18 médicos (entre ESF, clínicos, pediatras e ginecologistas)
- Onde -
ESF Morungava, ESF Erico Verissimo, ESF Nova Conquista, ESF Aristides D'Ávila e
UBSs Morada do Vale, Águas Claras, Vila Aliança, Bonsucesso, Princesa Isabel,
Centro e Parque dos Anjos.
- Salário
- Para estatutários e com contrato emergencial: R$ 2.962,16 (20h). Plantonista
24 horas: R$ 5.183,78. Médico de Família e comunitário: R$: 10.172,19 (40h).
Regimes Especiais para Médicos Estatutários: R$ 5.183,78 (30h) e R$ 7.405,40
(40h).
-
Contratação - São realizadas por concurso público e também via contratação
emergencial. Este último caso é válido por seis meses, prorrogável por igual
período, não podendo ultrapassar o prazo de validade da lei municipal que
autorizou a contratação. Há vagas em aberto para contratação emergencial,
divulgadas no site da prefeitura, no portal do Cremers e nos demais meios de
comunicação. Existe a previsão de concurso em 2013.
GUAÍBA
- Quantos
- Dois médicos clínicos
- Onde -
UBS Cohab
- Salário
- R$ 5 mil (30h), com vantagens e gratificações
-
Contratação - Por concurso e de forma emergencial. Hoje, os dois médicos que
faltam serão contratados de forma emergencial (seis meses, prorrogáveis por
mais seis). O prefeito Henrique Tavares, que é médico concursado do município,
diz que o planejamento é abrir concurso até o final do ano.
ELDORADO
DO SUL
- Quantos
- 18 (sete clínicos, seis pediatras, um cardiologista, um ginecologista, dois
ESF e um ecografista)
- Onde -
Postos de Bom Retiro, Distrito, Sans Soucy, Picada, Progresso, Central e PA
- Salário
- R$ 2.691 (20h, mais bonificações), R$ 4 mil (plantão) e R$ 1,3 mil de difícil
acesso
-
Contratação - Concurso e emergencial (um ano, no máximo). Em breve, haverá
chamamento para oito clínicos gerais, seis pediatras, um ginecologista, um cardiologista
e um infectologista.
Fonte:
Aline Custódio │ Roberta Schuler | DIÁRIO GAÚCHO
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