Médicos
Populares se solidarizam com Ana Luiza Lima, estudante de Medicina atacada por
discurso sobre políticas de saúde
A estudante de medicina Ana Luiza Lima, da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte (UFRN), denunciou, em seu perfil no Facebook, as ofensas
sofridas após discurso (vídeo
abaixo) na cerimônia de dois anos do Programa Mais Médicos, em Brasília. Luiza
falou sobre as transformações que a educação provocou na sua vida, a partir da
oportunidade de estudar medicina por políticas públicas do governo Dilma
Rousseff.
“Vadia”, “ignorante”e “médica vagabunda pobre” foram alguns dos
adjetivos usados por médicos e estudantes para ofendê-la. “Fui atacada em minha
página pessoal brutalmente por médicos e futuros médicos, além de outras
pessoas. O machismo e a elite mostraram sua cara”, escreveu Luiza. A Rede
Nacional de Médicas e Médicas Populares divulgou nota nesta terça-feira (11) em
solidariedade à jovem.
Confira, integralmente, a nota da Rede:
Nota de Desagravo da Rede de Médicas e Médicos Populares à Ana
Luiza Lima
A onda de ódio não passará!
A Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares vem, através desta
nota, prestar solidariedade à estudante de Medicina da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte (UFRN), Ana Luiza Lima, que recentemente comoveu todo o
país com seu discurso na comemoração dos dois anos do Programa Mais Médicos.
Seu discurso emocionado, por meio do qual agradece as recentes políticas educacionais
que permitiram “a neta de um agricultor sonhar em ser doutora” (nas próprias
palavras dela) inspirou milhões, mas provocou a ira de um setor reacionário e
conservador, que encontra em parte da nossa categoria uma das suas mais
perversas formas de expressão.
A onda conservadora dentro da categoria mostrou sua face logo após
o anúncio da vinda de médicas e médicos cubanos para atender áreas de difícil
provimento destes profissionais por parte do governo federal. Erigiu funerais
da Presidenta Dilma e do Ministro Alexandre Padilha e perpassou por cenas
nefastas como o “corredor polonês” contra os médicos cubanos no Ceará, com
direito a ovos arremessados e xingamentos que não merecem mais ser repetidos.
Vários colegas foram perseguidos pelos conselhos regionais de Medicina (CRMs)
Brasil afora por se posicionarem favoráveis ao Programa Mais Médicos e não se
alinharem com o discurso corporativista, permanecendo as ameaças dos CRMs sobre
os médicos que contribuem com o programa (supervisores e tutores) até hoje.
Agora a vítima é uma estudante de Medicina que cometeu o pecado de
falar a verdade. Uma estudante oriunda de família humilde que ousou entender
que seu sucesso hoje foi fruto de uma política pública e ousou agradecer à
Presidenta Dilma pelo esforço de manter políticas voltadas aos mais pobres
deste país. O ódio contra Ana Luiza manifestou-se não apenas sob a forma de
machismo – numa das regiões do país onde as mulheres mais sofrem com violência
e onde o patriarcado se mantém firme e forte – mas, fundamentalmente, como ódio
de classe, ódio ao que representou o seu discurso, ódio ao agradecimento à
Presidenta, ódio de quem não suporta ver seus privilégios ameaçados.
Por tudo isto e muito mais, a Rede Nacional de Médicas e Médicos
Populares denuncia a ofensiva conservadora que se materializa no ódio à Ana
Luiza e presta irrestrita solidariedade à nossa futura colega. Saiba, Ana
Luiza, que assim como você, existem médicas e médicos que se preocupam com o
povo brasileiro, que respeitam sua diversidade étnica, sexual, religiosa e ideológica,
que se preocupam com a conformação do SUS como sistema de direitos sociais,
público, gratuito, integral e de qualidade. Assim como você, existem médicas e
médicos que sonham e que fundamentalmente lutam por um futuro onde este tipo de
agressão à você fique num passado distante.
Todo apoio à Ana Luiza Lima
Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares
Leia o relato de Ana Luiza na página pessoal
dela no Facebook:
QUEM QUER A CABEÇA DA ESTUDANTE DE MEDICINA?
“Me pergunta, que tipo de sentimento é o medo? Te respondo — dos
outros! O meu é o mesmo há várias luas…Deixa os verme falar pelos cotovelos eu
ainda falo pelas ruas!!!!” – Emicida.
Vim aqui pra deixar coisas claras. Vim falar porquê a minha
garganta não aguenta o nó que se formou. E eu NUNCA fui de calar. Fui convidada
a falar sobre a transformação que a educação causou na minha vida e sobre a
alegria de cursar medicina. E assim escrevi um texto, de coração e de peito
aberto. E hoje penso em tudo que eu disse e tudo que eu queria ter dito mas não
foi ouvido. Minhas palavras ecoaram. Porém nunca foram direcionadas à NENHUM
partido político. Foi o reconhecimento de um acerto e uma reafirmação do que eu
acredito e luto. Fui atacada em minha página pessoal brutalmente por MÉDICOS E
FUTUROS MÉDICOS, além de outras pessoas. O machismo e a elite mostraram sua
cara. Fui chamada de vadia, de MÉDICA VAGABUNDA DE POBRE, ignorante, não
merecedora de cursar medicina. Me foi dito que iam fazer de TUDO pra que eu não
conseguisse emprego depois de formada. De que eu não sabia com QUEM estava
lidando. Que eu merecia LEVAR UMA SURRA pra aprender a deixar de ser corrupta.
Me mandaram CALAR MINHA BOCA NOJENTA DE POBRE E DE VADIA. De novo. Está tudo
guardado, não para dar respostas. Mas porque aprendi desde cedo a não responder
ódio com violência. Não. Eu NÃO tenho a SUA sede de sangue.
Mas eu tenho uma novidadinha pra essa classe COVARDE de
profissionais. A mesma classe que eu já vi combinando entre si no MESMO grupo,
de “tratar mal os negros, as feministas e os gays que chegassem nos
consultórios médicos, pra que esse povinho aprendesse seu devido lugar”. A
novidade é que minhas palavras não foram em nenhum momento pra vocês. Vocês que
ignoram a realidade cruel vivida todos os dias nos hospitais públicos. Minhas
palavras foram pros profissionais de saúde que dão o sangue todo dia, mesmo com
condições péssimas de trabalho, com salários atrasados, numa saúde abandonada e
caótica. Eles sim, são verdadeiros heróis. Minhas palavras foram direcionadas
àqueles que acreditam e lutam por um mundo transformado a partir da educação e
do amor. Minhas palavras foram um agradecimento aos professores, a classe
Trabalhadora com T maiúsculo!! Que têm seu serviço desvalorizado ao máximo, mas
toma a linha de frente na luta pela transformação diária do futuro de milhões
de jovens sem oportunidade no país.
Eu não fui nenhuma heroína, e eu conheço mil médicos que são
verdadeiros heróis. Que não precisaram de mais NADA além de força de vontade
pra vencer na vida. Mas me desculpa, é que eu penso além. Eu sonho com o dia em
que vamos cobrar das nossas crianças, apenas COMPETÊNCIA pra vencer, e não mais
heroísmo.
Eu tô falando com aqueles meninos que você tem medo quando para no
sinal, tô falando daqueles com fuzil na mão vigiando um fio de vida nos morros
das grandes cidades. Tô falando daquela menina que mora na rua e cata latinha,
daquele nos campos com enxada na mão cortando cana. Daquela que perde a
infância nas esquinas da prostituição. Tô falando daqueles que você insiste em
dizer que não existem. Por quê quando você percebe que ELES EXISTEM, coça em
você uma ferida podre de 515 anos. Te dá um medo na espinha quando aparece
alguém pra defender uma educação por eles e para eles. Te gela a alma a chegada
do dia em que o povo não vai mais esquecer seus Amarildos e suas Cláudias
Silvas….
Eu já consigo imaginar muitos de vocês rindo, pensando na
reeleição garantida, enquanto veem no jornal o povo gritando por mais prisões e
menos escolas. E apesar de me doer, eu entendo esse grito.
Eu engoli meu medo porque sei que toda luta pode ser desmerecida.
Eu dei minha cabeça à prêmio, e voltei pra casa com a esperança real de um
hospital universitário pra minha região onde muita gente tem sorte de ter a
esperança de ter um prato de comida.
Eu recebi um agradecimento da prefeita de uma das maiores cidades
do país, dizendo que graças às minhas palavras, um novo plano pra educação
pública vai ser pensado, e que ela se encheu de esperança e disposição para
lutar com unhas e dentes pelos professores da rede pública e pelos jovens em
situação de risco. Isso já me curou de todos os medos e de todo o ódio que me
foi jogado.
Esperança. Vontade de mudar. EMPODERAMENTO de um povo PELO seu
povo.
Eu sei que eu não sou nada nesse sistema corrompido e intricado.
Eu sei que não sou ninguém diante dos poderosos desse país. Mas eu tenho outra
novidade, eu não estou sozinha, e gente como eu, é quem te causa os piores
pesadelos à noite.
E eu vou seguir, mesmo frágil, mesmo com medo, mas sempre
acreditando.
“Então serra os punhos, sorria. E jamais volte pra sua quebrada de
mão e mente vazia.”
Vídeo:
Fonte:
Pragmatismo Político
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