quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Professor percorre 30 Km e atravessa igarapé com água no pescoço para imprimir atividades de alunos indígenas em RR

Trajeto para chegar até a impressora mais próxima da região leva duas horas e é preciso atravessar igarapés cheios e estradas inundadas porque não há barco para realizar a travessia. Escola atende a 88 alunos dentro da Raposa Serra do Sol.

Para chegar até a impressora, é preciso atravessar igarapés cheios e estradas inundadas — Foto: Reprodução/Instagram/Glycya
Para chegar até a impressora, é preciso atravessar igarapés cheios e estradas inundadas — Foto: Reprodução/Instagram/Glycya

“Tem sido um desafio e um desgaste físico. Mas, estamos fazendo nossa parte como educadores, tentando levar aquilo que temos como missão, que é estar preocupado com o ensino e aprendizado das nossas crianças e jovens.”

É assim que o professor Telmo Ribeiro, de 48 anos, descreve a saga que ele e outros cinco colegas de profissão enfrentam para levar aos alunos da escola indígena Presidente Afonso Pena as atividades do dia a dia.

Localizada na comunidade Matri, em Normandia, ao Norte de Roraima, a escola atende crianças e adolescentes indígenas de outras três regiões dentro da reserva Raposa Serra do Sol.

Formado em comunicação e arte pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), Telmo dá aula para estudantes do 6º ao 9º ano do ensino fundamental.

A cada 15 dias, ele percorre cerca de 30 Km para imprimir as atividades dos alunos. Isso porque na escola não tem impressora e a mais próxima da comunidade fica na região do Lago Caracaranã.

O trajeto leva duas horas e é feito de moto, bicicleta e a pé, em meio a igarapés cheios, estradas de chão inundadas e falta de barco, mas com muita vontade de levar educação ao próprio povo.

Moto atolada durante a travessia — Foto: Arquivo Pessoal/Telmo Ribeiro
   Moto atolada durante a travessia — Foto: Arquivo Pessoal/Telmo Ribeiro

“O povo sofre. Nós estamos em 2020, mas dá a impressão que esses lugares estão parados em 1980. Mas, se nós não fizermos pelo nosso povo, as pessoas de fora não vão vir fazer, pelos desafios que enfrentamos”.

O professor afirma que o percurso até as outras duas impressoras, nas comunidades Raposa e Guariba, é ainda mais longo, por isso opta por ir até o Caracaranã.

“Para imprimir as atividades a gente vai de moto até o igarapé cheio. Chegando lá tem que procurar um meio para atravessar sem molhar o material dos alunos. Do outro lado, pega a bicicleta, depois larga e vai caminhando pela estrada submersa pela água. Ainda corremos risco com animais como jacarés e cobras.”

Depois que imprime, ele repete todo o percurso na volta, e entrega na casa de cada aluno as atividades elaboradas.

Essa rotina de trabalho ocorre sempre em períodos chuvosos e torna o acesso à escola muito complexo. Por este motivo, mesmo antes da pandemia, quando alunos da rede estadual passaram a ter aulas remotas, a escola já funcionava em regime de ensino não presencial durante o inverno -- entre os meses de abril até setembro.

"Não tivemos dificuldade de fazer as atividades não presenciais com a pandemia, por conta desse desafio que acontece todos os anos", afirmou Telmo.

Comunidade Matri — Foto: Reprodução/Instagram/Glycya
   Comunidade Matri — Foto: Reprodução/Instagram/Glycya

Além da comunidade Matri, a escola atende crianças e adolescentes das comunidades Cachoeirinha, Japó, Nova Canaã e Sucubeira, que ficam distantes cerca de 12 a 18 km uma da outra.

Os seis professores são responsáveis por levar as atividades na casa de cada um dos 88 estudantes. E é nesse momento que os alunos também podem tirar as dúvidas em relação ao material.

“Para atendê-los passamos o dia inteiro. Saímos da escola às 7h e retornamos às 17h ou 18h”.

Procurada, a Secretaria de Estado de Educação e Desporto (Seed) não se pronunciou sobre o assunto.


Por Juliana Dama, G1 RR

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