Luciane Saldanha, de 19 anos,
falou à Justiça em Frederico Westphalen.
Evandro
Wirganoviz, irmão de Edelvânia, também é acusado do crime.
Mulher de Evandro Wirganoviz
depôs à Justiça em Frederico Westphalen (RS) (Foto: Caetanno Freitas/G1)
Emocionada
e nervosa, a mulher do réu Evandro Wirganovicz no caso Bernardo Boldrini
prestou depoimento à Justiça na manhã desta quinta-feira (18) no Fórum de Frederico Westphalen,
na audiência do processo que investiga a morte do menino de 11 anos. Luciane
Saldanha, de 19 anos, caiu em contradição em relação ao testemunho dado
anteriormente à Polícia Civil. Ela mudou a versão apresentada e disse que foi
“pressionada” pelos policiais.
“Eles
[a polícia] diziam para eu confessar que ele fez o buraco. Eles diziam que se
eu não confessasse que ele fez o buraco ele ia pegar mais tempo de cadeia”,
afirmou, no último dos oito depoimentos do dia.
O
corpo de Bernardo foi localizado no dia 14 de abril ano enterrado em um matagal
na área rural de Frederico Westphalen, a cerca de 80 quilômetros de Três Passos,
onde o garoto morava com a família. O menino estava desaparecido desde 4 de
abril. Evandro, que foi preso um mês após o crime, é irmão de Edelvânia
Wirganovicz, também ré no processo por homicídio e ocultação de cadáver. Além
dos dois, o pai de Bernardo, Leandro Boldrini, e a madrasta da criança, Graciele
Ugulini, também são acusados da morte.
Evandro chorou durante
depoimento da mulher
(Foto: Caetanno Freitas/G1)
(Foto: Caetanno Freitas/G1)
Luciane,
porém, não tem obrigação de dizer a verdade à Justiça. "Eles (a polícia)
recomendavam que eu colocasse respostas no meu depoimento. Se eu não sabia o
que dizer, os policiais indicavam o que tinha que falar. Eu nunca disse que ele
não pegou peixes. Eles me perguntaram quatro vezes se ele foi pescar. Aí no
depoimento colocaram como se eu tivesse dito que não. E eu também não disse que
ele chorou e não comentou nada. Eu tive medo (da polícia) e vergonha (do
advogado), para não dizer que fui pressionada”, desabafou.
A
versão foi confirmada pelo advogado de Evandro, ao final da oitiva. "Ela
(Luciane) foi induzida, pressionada a dizer certas coisas. Está bem claro isso,
vocês puderam ver. Então o depoimento policial para mim não tem legitimidade
nenhuma", avaliou Helio Sauer.
A
Polícia Civil diz que ambos concordaram com a transcrição do depoimento na
época. "Eu não tenho muito o que dizer sobre isso. Já era esperado que ela
(Luciane) fosse mudar a versão dela. Foi a delegacia de Frederico Westphalen
que colheu o depoimento dela. E tanto ela, quanto o advogado (Hélio) aceitaram
os termos das declarações. Eles leram o que foi escrito e concordaram",
afirmou ao G1 a delegada Caroline Bamberg,
responsável pelo inquérito do caso da morte de Bernardo. "Agora eles estão
contestando? Que tipo de advogado é esse?", questiona.
Ao
entrar na sala de audiência, Luciane chorou muito. Pediu água para se acalmar.
Atrás do advogado Hélio Sauer, que defende o réu, estava Evandro, que também
chorou muito no início da oitiva. O casal não trocou olhares. “Ele não tem
participação [no crime]”, resumiu Luciane logo no início.
Durante
o testemunho, o último e mais longo do dia, Luciane descreveu o final de semana
que o menino desapareceu. “Nós estávamos de férias naquela época, fomos passear
na mãe dele. Fomos para dormir lá. Íamos com frequência, quase todo final de
semana. Ele foi pescar à tardinha, ia seguido quando estava na casa da mãe. Às
vezes ele ia a pé, às vezes de carro. Eu já estava deitada quando voltou e no
outro dia eu vi os peixes”.
À
polícia, a mulher afirmou que não sabia se Evandro tinha voltado para a casa da
mãe com peixes. “Ele limpou os peixes no outro dia. Tinha aqueles com barbinha
grande e uns pequeninhos”, acrescentou.
Ao
ser perguntada sobre sua relação com a irmã de Evandro, disse que havia uma
amizade, mas que encerrou depois da divulgação do crime. “Me dava bem com Edelvânia.
Isso que ela fez, ter ajudado a outra... De ter feito o buraco”, continuou.
A
outra contradição no depoimento dado à Justiça se apresentou quando Luciane
afirmou que Evandro chorou de raiva por causa da irmã. À polícia, a mulher do
réu havia dito que ele “só chorou”, “nada comentou” e que ela teria suspeitado
do próprio marido. “Ele não falou nada acho que de raiva dela. Ele chorou de
raiva dela, dela ter feito isso. Ele nunca pensou que ela fosse fazer isso.
Nunca desconfiei dele”, disse.
Edelvânia Wirganovicz foi
escoltada até audiência
(Foto: Caetanno Freitas/G1)
(Foto: Caetanno Freitas/G1)
Outros
depoimentos
A
primeira a falar foi Ariane de Souza Cogo, ex-funcionária da farmárcia São João,
localizada no Centro da cidade. Foi ela quem vendeu o medicamento Midazolam a
Edelvânia e Graciele, madrasta do garoto. Segundo as investigações, o
remédio foi utilizado na morte da criança.
O
depoimento à Justiça confirmou a versão apresentada à Polícia Civil. A
testemunha disse ao juiz Jairo Cardoso Soares que Edelvania tinha todos os
dados necessários e a receita para comprar o medicamento. “Eu era caixa, não
fazia vendas. Mas era horário de pico e a loja estava muito cheia. Os primeiros
clientes que se dirigiram a mim foram a Edelvania e a outra mulher”, relatou.
"Eu não conhecia o medicamento, mas vi no sistema que era controlado. Vi que ela tinha todos os dados necessários. Ela comprou e foi embora. Como eu sabia que era Edelvania, não conferi fotos e outros dados do documento dela. Depois que os fatos foram à mídia eu reconheci que era a Graciele que estava com ela”, contou.
"Eu não conhecia o medicamento, mas vi no sistema que era controlado. Vi que ela tinha todos os dados necessários. Ela comprou e foi embora. Como eu sabia que era Edelvania, não conferi fotos e outros dados do documento dela. Depois que os fatos foram à mídia eu reconheci que era a Graciele que estava com ela”, contou.
Na
sequência, falou o empresário Henrique Bossoni Quatrin. Foi ele quem recebeu
uma quantia total de R$ 12 mil de Edelvânia para a compra de um apartamento,
avaliado em R$ 98 mil. De acordo com ele, ela pagou a última parcela do imóvel
em dinheiro.
"Ela pagou o apartamento em duas parcelas de R$ 6 mil. Eu havia dito isso na polícia porque no dia do depoimento não tinha total conhecimento de como foi o pagamento. Mas acessei os dados do nosso sistema e vi que foram duas: R$ 6 mil no final de 2013, em outubro, em depósito, e outros R$ 6 mil em abril. Esse último pagamento em espécie, em dinheiro, notas de 50 e 100”, relatou.
O homem mudou o depoimento que deu à Polícia Civil em relação à quantia recebida e às datas do pagamento. "Ela pediu para esticar um pouco o prazo. Mas em nenhum momento ela referiu se estava com dificuldade financeira”, disse.
"Ela pagou o apartamento em duas parcelas de R$ 6 mil. Eu havia dito isso na polícia porque no dia do depoimento não tinha total conhecimento de como foi o pagamento. Mas acessei os dados do nosso sistema e vi que foram duas: R$ 6 mil no final de 2013, em outubro, em depósito, e outros R$ 6 mil em abril. Esse último pagamento em espécie, em dinheiro, notas de 50 e 100”, relatou.
O homem mudou o depoimento que deu à Polícia Civil em relação à quantia recebida e às datas do pagamento. "Ela pediu para esticar um pouco o prazo. Mas em nenhum momento ela referiu se estava com dificuldade financeira”, disse.
Sobre
a participação de Evandro Wirganovicz, Valdecir Johann disse que viu o carro do
acusado próximo ao local onde o corpo do garoto foi encontrado. À Justiça, a
testemunha afirmou que o nível da água naquele dia “não daria peixe nenhum”,
fazendo referência à suposta pesca que o réu disse ter feito em uma
quarta-feira, dois dias antes da data em que o garoto foi morto, na sexta, 4 de
abril, segundo a polícia.
“Nunca tinha visto o Evandro com o carro lá. Ele sempre ia pescar, mas com o carro foi a primeira vez. O rio até dava uns peixes, mas aquele dia estava muito baixo, não daria peixe nenhum. O rio estava com nível da água bem baixo. Eu moro ali desde sempre, herdei do meu pai. Conheço bem”, sustentou.
“Nunca tinha visto o Evandro com o carro lá. Ele sempre ia pescar, mas com o carro foi a primeira vez. O rio até dava uns peixes, mas aquele dia estava muito baixo, não daria peixe nenhum. O rio estava com nível da água bem baixo. Eu moro ali desde sempre, herdei do meu pai. Conheço bem”, sustentou.
O
depoimento de Valdecir confirma a versão apresentada à Polícia Civil. “Conheço
o Evandro desde que nasceu. Sempre foi um guri tranquilo. Sou afilhado de
batismo da mãe dele”, assinalou.
Sobre
o mesmo assunto, Júlio Cesar Garcia também depôs. Ele estava com Valdecir
Johann quando viram o carro do Evandro. "A única coisa que eu sei foi o
carro do Evandro que estava lá uns dias antes onde o corpo do Bernardo foi
enterrado. Nós fomos buscar uns pedaços de madeira para a casa de boneca da
filha do Valdecir. Foi uns dias antes do aniversário da filha dele",
relembrou.
Evandro Wirganovicz também
acompanha audiência
(Foto: Caetanno Freitas/G1)
"Naquele
dia o rio estava baixo", confirmou. "Quando a gente chegou aqui,
consultamos a placa com a Brigada [Militar] e era do Evandro. Fizemos isso
porque não era normal ter carro lá naquela região. Volta e meia tinha gente
pescando lá no Rio Lajeado. Mas aquele dia o nível estava muito baixo",
reforçou.
Volnei
de Souza também confirmou o cenário. "Conhecia só o Evandro, não a
Edelvânia. Poucas vezes vi gente pescar ali no rio", destacou.
Também
falou ao juiz Leandro Assis Brondani, dono de uma agropecuária que explicou a
Edelvânia e Graciele o que as duas precisariam para abrir um buraco na terra.
Em seguida, indicou onde elas poderiam comprar as ferramentas necessárias.
“Naquele dia, não sei dizer bem quando foi a Edelvânia perguntou como se faz para fazer um buraco e o que ela precisaria. Eu respondi e disse o que ela precisaria, as ferramentas. Aí perguntei o motivo do buraco. Ela só me disse que seria próximo a casa da sua mãe”, disse o homem.
“Naquele dia, não sei dizer bem quando foi a Edelvânia perguntou como se faz para fazer um buraco e o que ela precisaria. Eu respondi e disse o que ela precisaria, as ferramentas. Aí perguntei o motivo do buraco. Ela só me disse que seria próximo a casa da sua mãe”, disse o homem.
O
sócio da ferragem onde Edelvania e uma outra mulher compraram uma pá e uma
cavadeira também foi ouvido. Hermes José Vendrusculo Scapin disse que a mulher
não quis registro da venda. Segundo as investigações, as ferramentas foram
utilizadas para enterrar o garoto de 11 anos.
“Ela
[Edelvania] não quis o registro de venda. Não sei quem era a outra pessoa, mas
quem comprou foi a Edelvania. Ela só pediu uma pá e uma cavadeira. Essa outra
pessoa não entrou, não falou nada, ficou na porta”, afirmou a testemunha ao
juiz Jairo Cardoso Soares. A venda, segundo Hermes, ocorreu entre o dia 1º e 4
de abril.
Além
dos irmãos e de Graciele, também é acusados pela morte o pai do menino, Leandro
Boldrini. Os quatro acusados respondem por homicídio qualificado e ocultação de
cadáver e estão presos preventivamente.
O
que as testemunhas disseram à polícia
Ao
menos quatro das oito testemunhas de acusação que prestam depoimento nesta
quinta deram esclarecimentos importantes quando falaram à Polícia Civil durante
as investigações do caso. O G1 teve acesso aos depoimentos das
testemunhas no inquérito policial.
Ariane
de Souza Bugo disse à polícia em 9 de maio que tem certeza de que foi Edelvânia
quem comprou o remédio Midazolam com receituário azul. Conforme o relato
de Ariane, Edelvânia estava acompanhada de Graciele Ugulini, a madrasta do
menino. Ela ainda acrescentou que a venda do remédio "é comum",
"ocorre com frequência", mas "sempre com a retenção da receita e
controle especial".
Hermes
José Vendrusculo Scapin, sócio de uma ferragem na cidade, foi o responsável
pela venda de uma pá e de uma cavadeira à Edelvânia. As ferramentas usadas para
enterrar o menino foram achadas pela polícia na casa da mãe de Edelvânia. Em 22
de abril, Hermes declarou à polícia que vendeu as ferramentas para ela e para
uma outra mulher que a acompanhava, a quem descreveu como "mais baixa,
cabelo preto e não aparentava ser gorda". Depois de olhar fotos de
Graciele Ugulini no sistema da polícia, descartou que fosse a madrasta de
Bernardo. Hermes relatou também que perguntou à Edelvânia se ela "iria
virar agricultura" e que ela respondeu que "iria levar (as ferramentas)
para a mãe".
Testemunhas desta quinta
deram depoimentos importantes à polícia
(Foto:
Reprodução)
A
mulher de Evandro, Luciane Saldanha, contou à polícia, em 3 de junho, detalhes
sobre o relacionamento com o marido e o dia em que ele foi pescar próximo ao
local onde Bernardo foi encontrado, na quarta-feira, dois dias antes da data que
o menino foi morto, segundo a polícia. Luciane disse que não lembra se Evandro
voltou sem peixes ou sujo de barro. Relatou, no entanto, que ele mudou de
comportamento e ficou nervoso quando sua irmã, Edelvânia, foi presa.
"Fiquei desconfiada porque foi bem na semana que o Evandro tinha ido
pescar (o crime)", relatou. Ela disse que questionou o marido sobre o fato
e que ele "não falou nada", "só chorou".
Volnei
Souza, outra testemunha, disse à policia no dia 23 de abril que não conhecia
pessoalmente Edelvânia, mas que falava com outros três irmãos dela, Luciano,
Dinho e Airton. Volnei é proprietário de algumas terras próximas ao Rio do
Mico, localidade onde o corpo de Bernardo foi encontrado, e declarou que viu o
carro de Edelvânia, um Fiat Siena cinza, estacionado perto da porteira de sua
propriedade. Ele disse que reconheceu o modelo do veículo por notícias
divulgadas nos meios de comunicação e que logo suspeitou do envolvimento da
acusada.
Já
Valdecir Johann declarou, em 17 de abril, que foi buscar madeiras em sua
propriedade no dia 2 de abril junto com um funcionário, na localidade de Linha
São Dimas. Disse que subiu em um barranco e avistou um Chevette amarelo escuro
e que acreditou que o veículo fosse de Evandro Wirganovicz. À polícia, afirmou
que desconfiou da presença do carro no local e avisou a Brigada Militar. Com a
placa, confirmaram que o proprietário era Evandro.
Valdecir
também relatou que, depois de ver os noticiários sobre o crime, pensou que
Evandro poderia ter "cavado o buraco", pois a terra "tinha
muitas raízes" e "a pessoa que fez o buraco precisou de bastante
força". Também registrou que viu Edelvânia acompanhada de uma menina
"de uns cinco anos de idade" quatro dias depois de ver o carro do
irmão dela no mesmo local. "Ela ficou toda sem jeito e disse que as duas
tinham ido molhar os pés no rio", afirmou.
Por
sua vez, Hermes Bossoni Quatrin, empresário, falou à polícia no dia 15 de
abril. Ele afirmou que Edelvânia fez um financiamento para adquirir um
apartamento com sua empresa, que estava construindo um conjunto habitacional
popular, onde cada imóvel custava R$ 90 mil. Conforme o relato de Hermes,
Edelvânia pagou R$ 4 mil em fevereiro e mais R$ 6 mil em abril, totalizando os
R$ 10 mil de entrada para o imóvel. Segundo a polícia, essa última parcela
teria sido financiada por Graciele em troca da participação dela no crime.
Bernardo Boldrini foi
encontrado morto em abril
(Foto: Reprodução/GloboNews)
(Foto: Reprodução/GloboNews)
Entenda
Conforme
alegou a família, Bernardo teria sido visto pela última vez às 18h do dia 4 de
abril, quando ia dormir na casa de um amigo, que ficava a duas quadras de
distância da residência da família. No dia 6 de abril, o pai do menino disse
que foi até a casa do amigo, mas foi comunicado que o filho não estava lá e nem
havia chegado nos dias anteriores.
No
início da tarde do dia 4, a madrasta foi multada por excesso de velocidade. A
infração foi registrada na ERS-472, em um trecho entre os municípios de Tenente
Portela e Palmitinho. Graciele trafegava a 117 km/h e seguia em direção a
Frederico Westphalen. O Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM) disse que
ela estava acompanhada do menino.
O
pai registrou o desaparecimento do menino no dia 6, e a polícia começou a
investigar o caso. No dia 14 de abril, o corpo do garoto foi localizado.
Segundo as investigações da Polícia Civil, Bernardo foi morto com uma superdosagem
de um sedativo e depois enterrado em uma cova rasa, na área rural de Frederico
Westphalen.
O
inquérito apontou que Leandro Boldrini atuou no crime de homicídio e ocultação
de cadáver como mentor, juntamente com Graciele. Ainda conforme a polícia, ele também
auxiliou na compra do remédio em comprimidos, fornecendo a receita. Leandro e
Graciele arquitetaram o plano, assim como a história para que tal crime ficasse
impune, e contaram com a colaboração de Edelvania e Evandro, concluiu a
investigação.
Caetanno Freitas
Do G1 RS, em Frederico Westphalen
Nenhum comentário:
Postar um comentário