O Ministério Público interpôs recurso especial
junto à Segunda Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Estado, solicitando
que ele seja encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça, para reverter acórdão
da 5ª Câmara Criminal que absolveu um motorista de aplicativo condenado em
primeira instância por estuprar uma passageira. O recurso especial foi
interposto nesta segunda-feira, 09, e é assinado pelo coordenador da
Procuradoria de Recursos, Luiz Fernando Calil, pela procuradora de Justiça Ana
Maria Schinestsck e pela promotora-assessora Tânia Maria Hendges Bitencourt.
DEPOIMENTOS IGNORADOS
O recurso especial frisa que a 5ª Câmara
Criminal omitiu, no acórdão que inocentou o réu, depoimentos de testemunhas de
acusação. Uma delas afirmou que vítima “estava bastante bêbada, a gente tinha
bebido bastante aquela noite, aconteceu que uma hora na festa ela já estava um
pouco desmaiada, então o segurança ajudou a gente a trazer ela pra fora da
festa, ali fora a gente ficou um tempo conseguindo acessar o celular dela, que
ela não conseguia lembrar a senha do celular, aí quando ela conseguiu lembrar a
senha, a gente chamou o Cabify, e a gente colocou ela no carro, no banco de
trás”. Outra testemunha disse que a amiga “apagou, e ela não conseguia nem
colocar a senha do celular”. Esses depoimentos, prestados ao juiz de 1º grau,
foram levados em consideração para a condenação.
CULPABILIZAÇÃO DA VÍTIMA
Outro ponto apontado pela Procuradoria de
Recursos é que o acórdão refere que “a vítima admitiu que por vezes já se
colocava nesse tipo de situação de risco, ou seja, de beber e depois não
lembrar do que aconteceu”. Nesse sentido, a decisão admite que, durante a
conjunção carnal à qual foi submetida, a mulher estava em situação de risco –
confirmando, portanto, a vulnerabilidade e incapacidade da vítima durante o
fato narrado pela denúncia, o que confirma a ocorrência do crime previsto no
artigo 217-A, parágrafo 1º, do Código Penal.
O acórdão recorrido “tem como viés a
culpabilização da vítima, considerando o seu histórico (supostamente
desabonador, de ‘por vezes’ consumir bebidas alcoólicas) como fundamento para
afastar a responsabilidade do réu”, pontua o recurso especial.
PRESUMIDA IDONEIDADE DO MOTORISTA
Ainda, a compreensão do MP é de que a decisão
se mostra contraditória ao reiterar que a vítima “afirmou não lembrar de nada”
como fundamento para a absolvição, na medida em que tal circunstância apenas
evidencia o estado de absoluta incapacidade em que se encontrava quando foi
violentada. O recurso especial frisa que o acórdão tomou a suposta
irresponsabilidade de pessoas que confirmaram ter presenciado a absoluta
incapacidade da vítima e não terem adotado outras medidas para a sua proteção
como fundamento para a absolvição. “Não se pode ignorar ser razoável que as
testemunhas que acompanhavam a vítima e a colocaram dentro do veículo em estado
severo de embriaguez presumissem a idoneidade de motorista regularmente
inscrito em aplicativo, destinado exatamente ao transporte de passageiros”,
aponta o recurso especial.
NÃO EXISTE PROVA TARIFÁRIA
O MP entende, ainda, que o acórdão da 5ª Câmara
Criminal mostra-se contrário ao entendimento do STJ quando refere que não havia
prova do estágio de embriaguez incapacitante da vítima, pois não foi feito
exame de alcoolemia. Conforme julgamento em habeas corpus do STJ (HC
361.019/SC, QUINTA TURMA, DJe 10/10/2016), “não existe prova tarifada no nosso
ordenamento jurídico, podendo as instâncias ordinárias, soberanas na análise
fático-probatória, levar em consideração todas as circunstâncias e provas
produzidas durante a instrução criminal que entenderem relevantes para a
solução da controvérsia”. Nesse sentido, argumenta a Procuradoria de Recursos,
independe de confirmação eventualmente fornecida por prova técnica, fica
evidente a “embriaguez completa” em que se encontrava a vítima no momento da
violência.
Ministério
Público do Estado do Rio Grande do Sul
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