segunda-feira, 13 de abril de 2015

Quem vai nos ouvir?

13 de abril de 2015

Spray de Pimenta. Foto Italo Santos

Sábado, 11 de abril. Rio Grande/RS. No estádio Aldo Dapuzzo, casa do Sport Club São Paulo, o Grêmio Esportivo Brasil recebeu o Internacional de Porto Alegre e empatou em 1 a 1. Com o resultado, o Xavante sagrou-se bicampeão do interior – perderá apenas o título se avançar à final. Porém, não terei a honra de escrever somente sobre a campanha vitoriosa do rubro-negro. Durante o intervalo da partida, houve confronto entre torcida Xavante e Brigada Militar, e as informações veiculadas por boa parte da imprensa a respeito disso não condizem com os fatos.

O Brasil não joga no estádio Bento Freitas, sua casa, desde a partida contra o Flamengo pela primeira fase da Copa do Brasil, realizada no dia 25 de fevereiro deste ano. Em dois pontos diferentes, a arquibancada apresentou falhas estruturais. A direção pretende reconstruir a Baixada, mas enquanto isso não ocorre é preciso jogar em outras casas. O clube alugou e jogou cinco jogos na Boca do Lobo, estádio do maior rival, que mais tarde decidiu não aceitar mais o negócio. Por conta disso, o Aldo Dapuzzo foi locado e duas partidas nele foram realizadas – já contando a semifinal contra o Inter. Com exceção ao último jogo, nenhum problema foi registrado. Não houve violência nem depredação do patrimônio alheio. Pelo contrário, mesmo afastado do seu território, os índios Xavantes registraram a maior média do interior gaúcho. A Revista Placar foi mais além e, ao considerar apenas os quatro maiores estaduais do país (a saber: SP, RJ, RS e MG), informou que o Xavante tem a 13ª maior média, superando a casa dos 7 mil rubro-negros por rodada.

A partida contra o Internacional tinha tudo para ser especial. Há mais de 30 anos, o Brasil não chegava duas vezes consecutivas à semifinal do estadual. Além disso, um empate já garantiria o bicampeonato do interior. A vaga à Copa do Brasil do ano que vem também ficaria bem próxima. A invasão Xavante a Rio Grande também se repetiu. Festa completa. Enfim, um jogo histórico, à altura do que o Grêmio Esportivo Brasil representa para o futebol gaúcho.

Durante o intervalo, rubro-negros e colorados, separados por cordas, grade e policiais, trocavam ofensas. Quem está acostumado a ir a estádio de futebol sabe bem que essas situações são naturais e, na maioria das vezes, não passa disso. Em determinado momento, policiais foram em direção aos torcedores do time da capital e pediram a eles, imagino eu, para diminuírem o ritmo. Foi nesse mesmo espaço de tempo que os policiais do Batalhão de Operações Especiais (!) iniciaram uma ofensiva contra a torcida Xavante. Com cassetetes, as costas de diversos torcedores do Brasil tornaram-se alvos. Algumas pessoas reagiram frente à ação inesperada e desproporcional da Brigada Militar. Com a utilização de spray de pimenta e a explosão de duas bombas de efeito moral, a situação saiu de controle.

Uma menina, torcedora do Brasil, passou mal. Além de assustada com a situação, teve um ataque de asma em decorrência do spray de pimenta. Foi carregada por outro torcedor Xavante até a ambulância, que precisou sair do estádio. A imprensa chegou a noticiar que a menina saiu ferida pela própria torcida rubro-negra. Outros veículos afirmaram ainda que a jovem torcedora foi atingida por um tijolo arremessado pelos Xavantes. Horas mais tarde, essas versões foram desmentidas pela própria mãe da menina, nas redes sociais. O torcedor que a ajudou também se manifestou.

 

Como desfecho final, alguns torcedores do Brasil bateram em um homem da própria torcida. Não consegui confirmar o(s) motivo(s), porém adianto que nenhum conseguirá justificar as agressões e é sobre esse fato que devemos fazer a nossa autocrítica. Não podemos nos eximir dessa parcela de culpa, apesar de termos razão quanto ao início da confusão e à forma como ela foi relatada pela imprensa. As imagens dessa pancadaria generalizada foram usadas para apontar a causa de toda a confusão, quando na verdade foi efeito de uma situação que poderia ter sido evitada. As cenas ainda foram utilizadas em diversos materiais sensacionalistas para deleite de quem tem mais interesse em atacar a torcida do Brasil do que encontrar soluções para coibir a violência (policial ou não) nos estádios.

Infelizmente, a confusão não parou por aí. O jogador Paulão, do Internacional, foi flagrado atirando um objeto na torcida do Brasil. Vocês não viram em nenhum lugar algo sobre isso, certo? Os policiais do BOE que estavam dentro de campo também resolveram participar do fuzuê e soltavam, de vez em quando, os cães no alambrado, levando risco ao pessoal que gosta de assistir ao jogo por ali. Na tela, um torcedor do Brasil reagiu e foi preso. Detalhe que essa participação policial ocorreu na outra bandeirinha de escanteio, bem afastado da confusão exibida a exaustão pela imprensa.

objeto 

A maioria das matérias veiculadas na televisão, rádio e internet, erraram em maior ou menor grau. Não estamos aqui para avaliar e encontrar as razões para uma cobertura tão medíocre e desinteressada. Não exigimos, todavia, a omissão dos nossos podres, pois nós mesmo já expomos alguns que presenciamos (relembre aqui e aqui), mas queremos e esperamos o compromisso com a verdade. Depois que as notícias com informações equivocadas chegam às pessoas, o estrago é praticamente irreversível. No caso da torcida do Brasil, o dano é ainda maior, tendo em vista o nosso histórico de comportamento, que tem mudado nos últimos anos para melhor; além da busca incessante dos rivais em desqualificarem a nossa torcida, já que na arquibancada não conseguem obter vantagem. E não para por aí: é a segunda vez em dois anos que boa parte da mídia “reorganiza” a ordem dos fatos sem se preocupar se essa “organização” vai alterar a forma como as confusões aconteceram e, principalmente, como se originaram.

Ano passado, já tivemos uma grande exposição negativa a nível nacional quando, na verdade, fomos os grandes prejudicados. O time Xavante jogava no Paraná, contra o Londrina, em partida válida pelas semifinais do Campeonato Brasileiro Série D. Já havíamos vencido o time paranaense, em Pelotas, por 3 a 1. No Estádio do Café, abrimos 2 a 0 de vantagem. 

serie-d 

Classificação à final mais do que garantida. Só que o time do Brasil se viu envolvido numa grande confusão, tentou não reagir (até para não perder jogadores para a final) e foi, posteriormente, massacrado pela imprensa – com matérias desse nível – mesmo quando os responsáveis pela violência, no caso os dirigentes e funcionários do Londrina, espancaram um cinegrafista da RBS Pelotas – relembre com o texto “Quando o jornalismo apanha, dói em todos nós”. Para piorar, ainda fomos punidos pelo STJD e um time inteiro não pode jogar a segunda partida da final. Enfraquecido, não tivemos forças para superar o adversário e perdemos o título nos pênaltis.

Agora, contra o Internacional, em outra semifinal, a imagem do clube foi mais uma vez desgastada nacionalmente por uma confusão que a sua torcida não iniciou. Quanto a isso, o Portal Terra merece ser citado, pois foi o único a narrar fielmente o que aconteceu. Replicamos aqui, com grifos nossos, alguns trechos:

[…] A etapa complementar demorou para começar, pois uma confusão nas arquibancadas do Estádio Aldo Dapuzzo resultou em confronto de torcedores do Brasil com a Brigada Militar posicionada para a partida. Usando bombas de efeito moral e spray de pimenta, o policiamento feriu presentes e uma criança chegou a ser carregada até a ambulância que estava no local para ser atentida, após ter sido atingida pelos oficiais.


O árbitro Anderson Daronco foi obrigado a adiar o reinício da partida, pois a ação da Brigada não foi curta. Além de entrar em confronto indiscriminado com qualquer torcedor presente nas arquibancadas, a polícia pegou indivíduos específicos e os deteve, arrastando-os até fora do recinto.

Por fim, buscamos expor com este texto duas preocupações nossas: os (possíveis) danos ao clube e a violência no estádio, incluindo a violência policial. Quanto ao clube, já foi noticiado que o Procurador da Federação Gaúcha de Futebol (FGF), Alberto Franco, pode pedir que a próxima partida da semifinal seja sem torcida Xavante. Já falam também em possíveis perdas de mandos de campo. Enfim, apresentarão diversas sanções ao Grêmio Esportivo Brasil e à sua torcida sem a mínima apuração e resgate do que realmente ocorreu, ao invés de buscarem punições justas a quem realmente merece, incluindo os policiais do Batalhão de Operações Especiais.

Infelizmente, não é possível reverter o que foi noticiado por boa parte da imprensa esportiva. É provável que o clube vai ter que se esforçar para evitar as punições. Também não queremos que todos nos abracem emocionados pedindo perdão ou nos chamando de “coitadinhos”. Também temos a nossa parcela de culpa. Porém, este texto visa juntar imagens e depoimentos que corroborem a versão da torcida Xavante, que até agora não foi ouvida. Nós estamos dando voz a nós mesmos e, de certa forma, tentamos aqui resgatar um pouco da verdade que foi silenciada.

À torcida Xavante,

Pedro Henrique Krüger e Jéssica GEBhardt

Fotografias feitas por Italo Santos

Fonte: TODA CANCHA

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